Importante: O texto a seguir é de autoria de Vern Sheridan Poythress, professor de Novo Testamento no Seminário Teológico de Westminster.
Resumo.
2ª Tessalonicenses 1 sustenta o amilenismo porque está em tensão com os outros principais pontos de vista sobre o milênio. Em primeiro lugar, 2ª Tessalonicenses 1 está em tensão com o pré-milenismo pré-tribulacionista e mid-tribulacionista. O texto bíblico apóia a idéia de que a segunda vinda de Cristo é um evento unificado, em vez de dois eventos cronologicamente distintos. Ou seja, o arrebatamento dos santos a o aparecimento de Cristo ocorrerão em conjunto. Os versos 6 e 7 indicam que a revelação (apokalupsis) de Cristo traz uma reversão de status. O alívio para os cristãos somente pode ser identificado com o arrebatamento. Já a perturbação para os perseguidores não envolve uma tribulação de sete anos, mas o inferno, como descrito no versículo 9. Ambos os lados dessa inversão acontece ao mesmo tempo, a saber, "no" aparecimento de Cristo descrito no verso 7b. Logo, o arrebatamento cristão e o envio dos incrédulos ao inferno tomam lugar ao mesmo tempo.
Segundo, 2ª Tessalonicenses 1 está em tensão com o pré-milenismo pós-tribulacionista. O texto revela apenas duas classes de pessoas, ou seja, cristãos e seus adversários. Na segunda vinda, cristãos se alegrarão na eterna glória (v. 10) e seus oponentes experimentarão eterna destruição no inferno (v. 9). Ambos os destinos são finais e irreversíveis. Além disso, sabemos de outras passagens que, na segunda vinda, cristãos possuem corpos ressurretos, não sujeitos a morte. Seus oponentes experimentam a morte eterna. Assim, imediatamente após a segunda vinda, não haverá seres humanos com seus corpos em um estado inacabado. Não restará ninguém para povoar um suposto milênio a fim de que mais crianças possam nascer e que seres humanos ainda continuem a experimentar uma morte física. O pré-milenismo pós-tribulacionista pode ser considerado somente através da introdução de uma terceira categoria de pessoas, que não são nem cristãos nem opositores do cristianismo. Mas a idéia de uma terceira categoria contradiz o testemunho uniforme das Escrituras, que menciona apenas duas classes de pessoas, a saber, aqueles que são de Deus e aqueles que estão contra Ele. Produzir uma terceira classe do nada também ameaça modificar a seriedade da mensagem do evangelho, introduzindo a idéia de uma "segunda chance" para esta terceira classe no milênio. Terceiro, 2ª Tessalonicenses 1 está em tensão com o pós-milenismo. O texto dos versos 5-7 indica que cristãos podem esperar problemas por algum tempo. Pós-milenistas acabam por antecipar o alívio da segunda vinda, e não apenas um tempo vindouro de prosperidade milenar, como querem que seja.
Vamos considerar separadamente como o texto bíblico conflita com o pré-milenismo pré, mid e pós-tribulacionista, bem como com o pós-milenismo. [01] Como se poderia esperar, nenhuma das questões mundiais ligadas à 2ª Tessalonicenses 1 são novas no debate sobre o milênio. Mas novos ângulos aparecem ao considerarmos como as questões mundiais interagem com uma leitura atenta do texto em questão, no contexto da Tessalônica do primeiro século.
Tensão com o pré-milenismo pré e mid-tribulacionista.
Comecemos olhando para o pré-milenismo pré e mid-tribulacional. Em ambos os pontos de vista, o arrebatamento dos santos e a manifestação de Cristo são cronologicamente distintos. Somente os santos vêem Cristo no arrebatamento, enquanto a segunda vinda visível acontece alguns anos depois. A idéia que temos aqui, de dois eventos cronologicamente separados, não é fácil de harmonizar com 2ª Tessalonicenses 1. [02]
Iniciemos com os versos 6 e 7. Estes versos indicam que a revelação (apokalupsis) de Cristo traz uma reversão de status. Aqueles que causam tribulação serão tribulados, porém, você que é tribulado experimentará alívio. "Você" significa os cristãos de Tessalônica. Paulo inclui a si mesmo e seus amigos dizendo "e a nós também." O alívio vislumbrado aqui é claramente o alívio das tribulações que os cristãos de Tessalônica e também outros cristãos estão agora experimentando nas mãos dos perseguidores.
O verso 7 especifica que esse alívio vem "quando se manifestar o Senhor Jesus desde o céu com os anjos do seu poder..." Ou seja, o alívio vem em conexão com esta revelação de Jesus Cristo. Ele vem no momento desta revelação e como um aspecto ou implicação dela. [03] Conseqüentemente, os cristãos tessalonicenses não devem concentrar suas esperanças na expectativa de alívio antes da revelação de Jesus Cristo. Outras passagens afirmam a idéia geral de que cristãos devem esperar por sofrimento e perseguição neste mundo (1ªTs 3:4, 2:14; 2ª Tm 3:1-13, 4:4-5; At 14:22; 1ª Pe 4:1-5, 12-19).
O momento em que os cristãos experimentarão alívio só pode ser identificado com o arrebatamento (como em 1ª Tessalonicenses 4:13-18). Paulo espera que as tribulações continuarão até o arrebatamento. Não haverá mais tribulação para os cristãos depois de serem arrebatados. Quaisquer que sejam os detalhes sobre a segunda vinda de Cristo, a transição fundamental para os cristãos ocorrerá quando o rapto lhes trouxer alívio das tribulações.
Antes de prosseguirmos, devemos lidar rapidamente com uma dificuldade ocasional. Vivendo no século XX, sabemos que os cristãos tessalonicenses, bem como Paulo e seus amigos, morreram antes da segunda vinda ocorrer. Na realidade, eles tiveram um certo "alívio" de suas tribulações quando morreram, em vez de no arrebatamento. [04]
Como podemos lidar com essa dificuldade? Devemos lembrar que, embora Paulo tenha escrito sob a inspiração do Espírito Santo, o Espírito não revelou a ele ou a qualquer outro a época da segunda vinda (Marcos 13:32; Atos 1:7). Por isso Paulo fala como alguém que poderia estar vivo no momento da segunda vinda (1ª Ts 4:15; 1ª Co 15:510. Além disso, os tessalonicenses sabiam que alguns cristãos já haviam morrido, e muitos morreriam se a vinda de Cristo ainda estivesse longe de acontecer (1ª Ts 4:13-14). Muito apropriadamente, Paulo não concentrou suas esperanças na possibilidade da sua morte certa, mas na certeza do arrebatamento. A morte é apenas um "alívio" parcial e ambíguo; o verdadeiro alívio vem com a ressurreição do corpo (1ª Ts 4:13-18; 2ª Co 5:4; 1ª Co 15:51-57). Portanto, em 2ª Tessalonicenses 1 Paulo fala como alguém que tem seu foco na segunda vinda. Se Paulo tivesse incluído algumas qualificações técnicas sobre o fato de que alguns cristãos podem morrer antes da segunda vinda, ele estaria se desviando do ponto principal. Por outro lado, Paulo já havia explicado este tipo de qualificação complexa aos tessalonicenses em 1ª Ts 4:13-18. [05] Concluímos, então, que 2ª Tessalonicenses 1 aplica-se eminentemente a todos os cristãos que estiverem vivos no momento da segunda vinda. Mas, secundariamente, o texto se aplica a todos os que morreram no que diz respeito ao corpo e aguardam a ressurreição. Há muito tempo eles esperam pela segunda vinda, como em Ap 6:9-10.
Com essa questão resolvida, podemos volta a considerar o ensino de 2ª Tessalonicenses 1. O uso específico da linguagem nos versos 7-10 indica que este momento de alívio é o momento da manifestação de Cristo. É a "revelação (apokalupsei, ἀποκαλύψει) do Senhor Jesus desde o céu com os anjos do seu poder, como labareda de fogo, tomando vingança dos que não conhecem a Deus..." Para um leitor habitual, esta descrição certamente soa como uma segunda vinda pública e visível. A "revelação" não é apenas visível para os santos, mas é uma revelação que inclui chamas flamejantes para tomar vingança dos inimigos de Deus.
Além disso, no A.T. a "revelação" ou manifestação de Deus é regularmente o primeiro evento na guerra santa. Deus aparece em glória e poder para lutar contra os seus inimigos (Zc 14:3-4, 9:14-16; Is 63:1, 66:15-16; Hc 3:3-15; etc.). [06] Vingança é uma conseqüência da Sua manifestação. Esse mesmo padrão é evidente em 2ª Ts 1:7-8, onde a vingança acompanha a presença de Deus. Deus aparece acompanhado de anjos e fogo, e de acordo com a perspectiva bíblica, os anjos e fogo estão integralmente envolvidos como instrumentos na execução da vingança.
Assim, o arrebatamento dos santos, o ponto em que acontece o alívio, acontece "na" revelação pública de Jesus Cristo. Os dois eventos - o arrebatamento e a revelação - são basicamente simultâneos, e são dois aspectos de uma revelação de Jesus Cristo.
Os defensores do pré e mid-tribulacionismo têm uma dificuldade aqui. Eles podem argumentar que, a despeito da linguagem forte dos versos 7-8, o aparecimento de Cristo tem que acontecer somente para os cristãos. A descrição aqui relata apenas o arrebatamento - eles dizem -, não a segunda vinda pública. [07] Mas em seu argumento eles separam o aparecimento (que dizem ser somente para os cristãos) dos ato de vingança (que é dirigido aos não cristãos). Tal separação é completamente artificial. Deus aparece a seus inimigos, julgando-os e punindo-os. O A.T. mostra uma ligação regular teológica e causal entre os dois em suas descrições do dia do Senhor.
Mesmo se admitirmos ao pré e mid-tribulacionismo a possibilidade de uma separação, eles ainda não escapam de todas as dificuldades. A simetria nos versos 6-7 indica que a revelação de Jesus Cristo tem dois lados. [08] Um dos lados envolve alívio para os cristãos (o arrebatamento). O outro lado envolve punição aos seus adversários. De acordo com as posições pré e mid-tribulacionista, a punição é a Grande Tribulação propriamente dita. Mas não é isso que 2ª Tessalonicense 1 diz. Os oponentes receberão "vingança" em conexão com a chama flamejante do aparecimento de Cristo (v. 8). Esta vingança é ainda definida no verso 9 como "eterna perdição, ante a face do Senhor e a glória do seu poder." O verso 9 está falando sobre o castigo no inferno, não em algum período de tribulação. Note também a ligação entre a presença do Senhor no v. 9 e Sua revelação no v. 7, entre a punição (diken, δίκην) no v. 9 e a vingança (ekdikesin, ἐκδίκησιν) no v. 8, entre "Seu poder" no v. 9 e os "anjos poderosos" no v. 7. [09] Os vínculos são estreitos demais para tentar desajeitadamente distinguir dois estágios diferentes aqui. Os cristãos de Tessalônica certamente entenderam a descrição como uma imagem unificada, de acordo com as imagens unificadas do "dia do Senhor" no A.T.
A unidade cronológica dos acontecimentos é reforçada pela conjunção "quando" (hotan, ὅταν) no início do verso 10. Os versos 9 e 10 nos oferecem a mesma antítese simétrica como o fazem os versos 6-7. Nos versos 9 e 10 os santos [10] experimentam alívio e reivindicação, enquanto os ímpios experimentam o inferno. Os dois julgamentos são simultâneos ("quando"), assim como a reversão nos versos 6-7 envolve simultaneidade no alívio para os santos e na punição para os seus adversários.
Resumindo, o lançamento dos incrédulos ao inferno é simultâneo com o alívio dos cristãos no arrebatamento. Não há estágio intermediário de tribulação entre os dois eventos.
Portanto, o arrebatamento dos santos e a manifestação pública de Cristo ocorrerão em conjunto. 2ª Tessalonicenses está em tensão neste ponto o pré-milenismo pré e mid-tribulacionista.
Talvez a melhor resposta para essa interpretação é oferecida por Paul D. Feinberg. [11] Ele observa que a revelação de Cristo em 2ª Ts 1:7 poderia...
Tensão com o pré-milenismo histórico.
Agora, consideremos o pré-milenismo histórico, ou pré-milenismo clássico. Nesta perspectiva, a segunda vinda é um único evento unificado. Após este evento inicia-se um período milenar de paz e prosperidade, durante o qual as pessoas continuam a ter filhos e são afetadas pela morte.
2ª Tessalonicenses 1 cria dificuldades para essa posição também. O texto apresenta somente duas classes de pessoas, a saber, os cristãos e seus adversários. Tecnicamente falando, no versículo 6 Paulo menciona somente os perseguidores, não todos os incrédulos. [12] Mas a perseguição é apenas a forma mais virulenta de rejeição à Deus que caracteriza todos os não-cristãos (Ef 4:17-19, 2:1-3; Rm 3:9-20). Por isso, a princípio, a descrição de Paulo se aplica ao grupo mais amplo. No verso 8, a descrição, na realidade, toma proporções maiores. A retribuição vem para aqueles "que não conhecem a Deus e os que não obedecem ao evangelho de nosso Senhor Jesus."
Em suma, na segunda vinda os cristãos desfrutam a glória eterna (v. 10) e os não-cristãos experimentam a destruição eterna no inferno (v. 9). Ambos os destinos são finais e irreversíveis. Além disso, sabemos de outras passagens em que cristãos possuem corpos ressuscitados, não sujeitos à morte. Não-cristãos conhecem a morte eterna. Conseqüentemente, não há seres humanos deixados com corpos em um estado intermediário. Não haverá ninguém para povoar um suposto milênio, onde mais crianças nascem e seres humanos ainda experimentam a morte física. [13] Curiosamente, pré-tribulacionistas estão bem cientes dessa dificuldade, e usam ela como um argumento contra o pós-tribulacionismo. [14] A inexistência de qualquer ser humano em uma categoria intermediária não é meramente uma dificuldade técnica incidental. A totalidade da Bíblia ensina que as pessoas estão com Deus ou contra Ele. Não há neutralidade na batalha espiritual descrita em Efésios 6:10-20, 1ª João 5:18-21, e Apocalipse.
O evangelho em si está em jogo nesta questão. O único remédio para o pecado e rebelião espiritual encontra-se no sacrifício de Jesus Cristo. Se você está unido em Cristo, você está redimido. Se você não está unido, então você não está redimido. Na segunda vinda, aqueles que estão unidos em Cristo receberão corpos ressurretos, e aqueles que não estão unidos irão para o inferno. Não há uma terceira categoria; não haverá pessoas em uma terra-sem-ninguém. Cristo é o único redentor (Atos 4:12). "Quem não está comigo, é contra mim," Ele diz (Mt 12:30). "Quem tem o Filho tem a vida; quem não tem o Filho de Deus não tem a vida." (1ª Jo 5:12). Portanto, não é possível introduzir uma terceira categoria hipotética sem violentar as verdades centrais do evangelho.
Ainda, o pré-milenismo pós-tribulacionista tem comumente sugerido a partir de textos como Zc 12:10-13:1, Rm 11:26, e Ap 1:7 que numerosos judeus depositarão sua fé em Cristo no momento do Seu aparecimento. [15] À primeira vista, essa teoria parece oferecer uma saída eficiente. Mas há problemas com ela.
Primeiro, não é claro que a teoria pode ser conciliada com 2ª Tessalonicenses 1, uma vez que o texto opera claramente em termos de duas categorias de pessoas. Segundo, nenhum dos textos oferecidos para apoiar tal teoria menciona claramente uma conversão dos judeus no mesmo momento do aparecimento visível de Cristo ao invés de antes dele. [16] Terceiro, nem essas nem outras passagens bíblicas contêm alguma sugestão que possa nos encorajar a quebrar a dicotomia fundamental entre salvos e perdidos. Quarto, nenhuma passagem no Novo Testamento incentiva-nos a introduzir uma idéia pastoralmente perigosa, de que o aparecimento final de Cristo permitirá uma "segunda chance" de salvação e não o encerramento do tempo da salvação. Logo, se os judeus são salvos por Cristo, gozam os mesmos privilégios como todos os salvos, ou seja, a ressurreição do corpo na vinda do Senhor Jesus.
Tensões com o pós-milenismo.
Finalmente, vamos considerar o pós-milenismo. Ele diz que, através do evangelho, a fidelidade à Cristo e a obediência cristã irão se espalhar gradualmente pelo mundo até que a grande maioria das pessoas se tornem cristãs. Sociedades e suas instituições serão progressivamente conformadas à vontade de Deus, e uma era de grande paz e prosperidade seguir-se-á antes da segunda vinda.
Em minha opinião, existe a possibilidade disso acontecer. De fato, porque eu fico impressionado com o poder de Deus para a salvação no evangelho (Rm 1:16), eu estou otimista quanto ao futuro. Cristo pode retornar muito em breve, mas se Ele não o fizer nos próximo cem anos, podemos ver uma grande colheita para o evangelho. Alguns outros amilenistas mostram o mesmo otimismo. [17]
Qual é, então, a diferença entre este tipo de "amilenismo otimista" e um pós-milenismo desenvolvido? Existe alguma diferença significativa entre eles?
2ª Tessalonicense 1 contribui para indicar uma diferença remanescente. O texto, eu afirmo, nos pede para concentrar nossa esperança na segunda vinda de Cristo, não em uma prosperidade milenar hipotética tomando lugar antes da segunda vinda. O restante do Novo Testamento tem um enfoque similar. Assim, na minha opinião, o problema principal que atualmente separa amilenistas de pós-milenistas não é uma questão de mera possibilidade, ou seja, o que possivelmente pode acontecer se o retorno de Cristo está ainda a algumas décadas de distância. Ao contrário, a questão é saber se a promessa e a profecia bíblica convidam os cristãos a concentrar a esperança sobre a possibilidade de um milênio. Será que tal prosperidade é o foco principal da expectativa profética, e que ela é certamente garantida pela profecia? Pós-milenistas dizem que sim, e com base nisso eles esperam confiantemente que a segunda vinda está ainda longe de acontecer. Logo, eles se encontram teologicamente inapropriados e psicologicamente impossíveis de concentrar suas esperanças primariamente sobre a segunda vinda. Em contraste, pré-milenistas e amilenistas pensam que a segunda vinda é o próximo evento principal no plano de Deus para a história. Pode ser muito em breve, e esperamos e oramos para que o Senhor venha. [18]
Agora considere 2ª Tessalonicenses 1. Ele está em tensão com o pós-milenismo, na medida em que pós-milenistas querem concentrar suas esperanças sobre a vinda de uma prosperidade milenar. O texto dos versos 5-7 indica que os cristãos podem continuar esperando problemas por algum tempo. Mas, conforme querem que aconteça, eles não apenas esperam um tempo de prosperidade milenar, mas antecipam o alívio da segunda vinda.
Certamente, perseguições vêm e vão, como pode ser visto na história do reino do norte de Israel, bem como no livro de Atos. Algumas vezes os cristãos podem ter uma porção de "alívio" quando diminui a perseguição, ou quando a perseguição toma formas mais "civilizadas". Mas o foco da nossa esperança, de acordo com 2ª Ts 1, está na segunda vinda de Cristo. Se os problemas variam de forma ou se cristãos podem, por vezes, esperar estar em superioridade numérica, é um ponto de vista teológico de interesse meramente secundário.
Alguns pós-milenistas têm se esforçado para fugir das implicações de 2ª Ts 1, insistindo que o texto está realmente descrevendo a queda de Jerusalém em 70 d.C., ao invés de a segunda vinda. [19] De acordo com David Chilton e alguns outros pós-milenistas contemporâneos, não só 2ª Tessalonicenses, mas a maioria das outras passagens neotestamentárias que têm sido tradicionalmente entendidas como descrevendo a segunda vinda, estão na verdade descrevendo a queda de Jerusalém em 70 d.C. Para ele a linguagem é figurada e não literal. Chilton aplica um procedimento similar em 1ª Ts 5:1-9. [20] Mas ele acredita que 1ª Ts 4:13-18 e 1ª Co 15:51-58 falam sobre a segunda vinda. [21]
Não podemos entrar em todos os detalhes do sistema de Chilton neste momento. Mas afirmamos que este tipo de abordagem não pode ser razoavelmente sustentado no tratamento que faz da carta. 1ª Ts 4:13-18 é sobre a segunda vinda. 1ª Ts 5:1-10, que está logo à frente, também deve ser sobre a segunda vinda. Assim, 2ª Tessalonicenses 1, que se baseia em 1ª Tessalonicenses, é também sobre a segunda vinda. Nada nas cartas possui qualquer tendência real em apontar para uma direção diferente a partir deste entendimento.
Chilton e outros como ele podem encontrar o que querem nas cartas aos tessalonicenses somente porque lêem o texto com uma idéia previamente concebida. Mas suas interpretações se desintegram quando tentamos firmemente nos colocar no lugar dos cristãos de Tessalônica. Paulo esteve naquela cidade por algumas semanas (Atos 17:1-10). Além disso, mesmo Paulo tendo falado à eles sobre a segunda vinda (2ª Ts 2:5), as cartas mostram que aqueles cristãos estavam confusos. Eles não compreendiam muito bem questões relativamente básicas de escatologia. Os tessalonicenses não tinham ainda um conhecimento profundo de algum sistema escatológico. Então, Paulo entendeu a situação dos tessalonicenses e suas limitações. Ele não teria usado uma linguagem de tal forma que aqueles cristãos quase que certamente não compreenderiam.
Uma vez que entendemos o nível em que Paulo deve ter comunicado a eles, segue-se que 1ª Ts 4:13-18 é sobre a segunda vinda. A transição em 5:1 não é violenta. Assim, os tessalonicenses entenderam os "tempos e épocas" de 5:1 como os tempos e épocas a respeito dos eventos associados com a segunda vinda. Por conseguinte, 5:1-10 é sobre a segunda vinda. [22]
Prosseguindo, 1ª Tessalonicenses é o cenário principal para 2ª Tessalonicenses. Tendo em vista a preocupação concernente à segunda vinda em 1ª Ts, os cristãos de Tessalônica são obrigados a entender 2ª Ts como uma continuação do mesmo tema. A questão não é se podemos inventar um esquema interpretativo, como Chilton o faz, capaz de interpretar toda a passagem em sentido figurado. A questão é se os tessalonicenses possuem alguma pista significativa que poderia levá-los a se afastar do que, do ponto de vista deles, é o sentido mais óbvio.
Portanto, não há como escapar do fato de que do ponto de vista dos cristãos de Tessalônica, 2ª Ts 1 é "obviamente" sobre a segunda vinda. Paulo sabia da capacidade dos tessalonicenses e não pretendia confundi-los. Assim, Paulo realmente estava falando sobre a segunda vinda.
Mas Chilton (p. 120) tem um outro argumento:
Ainda, do ponto de vista dos cristãos do primeiro século, independentemente se esperamos um curto ou longo período de tempo para a segunda vinda de Cristo, o julgamento fundamental ocorre na segunda vinda, não apenas na morte ou através de alguma calamidade histórica do passado. Deste modo, o princípio que Paulo expressa em 2ª Tessalonicenses 1 é válido não somente para os tessalonicenses, mas para todos os cristãos que estão sofrendo perseguição.
Lições de hermenêutica.
Curiosamente, um dispensacionalista como Walvoord (A Questão do Arrebatamento, 235-245) e um pós-milenista como Chilton mostram similaridades aqui. Ambos apelam ao fato de que a segunda vinda não aconteceu no primeiro século, a fim de invalidar a referência de 1:7-10 para a segunda vinda. Ambos interpretam 2ª Ts 1 dentro de uma complexa e totalmente articulada posição escatológica, tendo pouca consideração pelos leitores tessalonicenses que não eram tão sofisticados como eles.
A forma do argumento aqui nos alerta para os problemas que todos nós enfrentamos com respeito à circularidades na interpretação bíblica. É fácil para todos nós assumirmos que Paulo e os tessalonicenses tinham crenças exatamente como as nossas. Ou seja, nós inferimos que o Apóstolo Paulo ensinou aos cristãos de Tessalônica precisamente o que nós mesmos acreditamos. Se admitimos isso, presumimos que os tessalonicenses sabiam o que sabemos, e que eles entendiam naturalmente a carta de Paulo da mesma forma que nós entendemos. Por isso, 2ª Tessalonicenses significa exatamente o que já sabíamos que significava. Desse modo, o texto bíblico confirma nosso ponto de vista.
Lamentavelmente, tal argumento é falacioso. Qual é o resultado final de usar este princípio? Por mais estranha ou forçada que nossa interpretação moderna possa ser, podemos ainda nos assegurar de que o entendimento dos tessalonicenses corresponde à nossa própria interpretação. Afinal, os tessalonicenses sabiam o que Paulo realmente queria dizer, porque puderam colocar seu ensinamento em uma estrutura já bem estabelecida pelo seu ensinamento oral (o qual era naturalmente o mesmo que nossa própria visão moderna).
A alegação de que os tessalonicenses tinham uma estrutura completa e sofisticada parece atraente porque ela ajuda a proteger nossas posições modernas; mas é perigosamente circular e, creio eu, improvável, à luz da falta de entendimento daqueles cristãos e da estadia curta de Paulo em Tessalônica.
Voltando à questão do arrebatamento.
Essas observações hermenêuticas têm relevância para 1ª Ts 4:13-5:10, bem como para 2ª Ts 1. De que maneira?
Eu concordo que 1ª Ts 4:13-18 diz respeito ao arrebatamento. Mas Pré e mid-tribulacionistas têm geralmente pensado que 1ª Ts 5:1-10 diz respeito ao "dia do Senhor", que inclui tanto a Grande Tribulação e a segunda vinda visível. Na opinião deles, existem dois ou mais eventos cronologicamente distintos aqui. Se realmente pudéssemos separar dois ou mais eventos distintos por meio destas passagens de 1ª Tessalonicenses, teríamos, pelo menos, que ter alguma base para afirmar que aqueles cristãos já compreendiam o pré-tribulacionismo quando receberam a segunda carta. Nesse caso, 2ª Tessalonicenses seria então confusa aos cristãos de Tessalônica, mas não o suficiente para derrubar o entendimento que eles já possuíam.
A idéia de que 1ª Ts 4:13-5:10 lida com dois eventos separados cronologicamente tem seus próprios problemas. Ao interpretar estes versos, novamente corremos o perigo de assumir que os cristãos de Tessalônica tinham o conhecimento de um sistema completo antes mesmo de receberam a carta de Paulo. Por exemplo, podemos realmente presumir que os tessalonicenses já teriam se familiarizado com as distinções dispensacionalistas modernas sobre dois estágios? Ou será que eles agiram instintivamente, como um dispensacionalista moderno faz, com uma nítida distinção entre tribulação (amplamente concebida) e a Grande Tribulação? Será que eles distinguiam conscientemente entre ser removido da tribulação versus ser preservado e protegido, como eles mesmo passaram por isso? Será que eles viram uma palavra como "ira" (5:9) como uma alusão à Tribulação em distinção do julgamento final? A menos que os tessalonicenses fossem auxiliados por um sistema escatológico completo, os dispensacionalistas realmente possuem indícios para dizer-lhes que 1ª Ts 4:13-5:10 diz respeito a dois eventos sucessivos, ao invés de dois aspectos de um único evento?
Neste artigo, não podemos explorar em detalhes a interpretação de 1ª Ts 4:13-5:10, mas devemos estar conscientes de que algumas das mesmas circularidades hermenêuticas podem surgir, assim como em 2ª Tessalonicenses 1.
Traduzido por Mac.
[01] Para resumos úteis das principais posições, ver Robert G. Clouse, O Significado do Milênio: Quatro Pontos de Vista (Downers Grove: InterVarsity, 1977); Millard J. Erickson, Opções Contemporâneas de Escatologia: Um Estudo do Milênio (Grand Rapids: Baker, 1977); Richard R. Reiter, Paul D. Feinberg, Gleason L. Archer, e Douglas J. Moo, O Arrebatamento: Pré, Mid, ou Pós-tribulacionismo? (Grand Rapids: Zondervan, 1984).
[02] Meu argumento sobre este ponto é substancialmente o mesmo que o de Douglas J. Moo, "The Case for the Posttribulation Rapture Position", em Reiter, O Arrebatamento 187-88.
[03] Leon Morris, A Primeira e Segunda Epístolas aos Tessalonicenses (Grand Rapids: Eerdmans, 1991) 201n25.
[04] John F. Walvoord (A Bendita Esperança e a Tribulação: Um Estudo Bíblico e Histórico do Pós-tribulacionismo [Grand Rapids: Zondervan, 1976] 123-24; e A Questão do Arrebatamento [Grand Rapids: Zondervan, 1979] 236-37) conclui sobre esta base que 2ª Tessalonicenses 1 não pode ser todo sobre o arrebatamento. Tudo em 1:7b-10 descreve um julgamento no final do milênio. Mas ele não oferece nenhuma explicação da palavra ἐν no verso 7, que relaciona temporariamente as descrições dos versos 7b-10 com alívio aos tessalonicenses.
[05] Assim como a maior parte da erudição do Novo Testamento, eu acredito que 1ª Tessalonicenses foi escrita anteriormente à 2ª Tessalonicenses. Eu assumo também, sobre a base da afirmação explícita de 2ª Tessalonicenses, que Paulo é o verdadeiro autor (não uma carta pseudoepígrafa).
[06] Conferir, por exemplo, Tremper Longman, III, "The Divine Warrior: The New Testament Use of an Old Testament Motif," WTJ 44 (1982) 290-307; notar também que Is 66:15-16 LXX oferece um dos mais significativos antecedentes textuais para os versículos 7-8. Conferir Charles A. Wanamaker, As Espítolas aos Tessalonicenses (Grand Rapids: Eerdmans, 1990) 226-227; FF Bruce, Comentário Bíblico Mundial: Volume 45: 1 & 2 Tessalonicenses (Waco, TX: Word Books, 1982) 151.
[07] Paul D. Feinberg, "Resposta", em Reiter, Arrebatamento 227, menciona brevemente esta possibilidade.
[08] Charles A. Wanamaker, As Epístolas aos Tessalonicenses (Grand Rapids: Eerdmans, 1990) 223-224.
[09] Cf. Wanamaker, As Epístolas aos Tessalonicenses 228.
[10] "Santos" no v. 10 refere-se aos cristãos, e não aos anjos, como a frase paralela "em todos os que creram" deixa claro. Earnest Best, Um Comentário sobre a Primeira e Segunda Epístolas aos Tessalonicenses (New York: Harper & Row, 1972) 265.
[11] Feinberg, "Resposta", em Reiter, Arrebatamento 227.
[12] Melhor Assim, Tessalonicenses 262-263.
[13] Douglas Moo brevemente comenta a possibilidade de um "milênio" sem a morte física (Moo, "Resposta", em Reiter, Arrebatamento 162). Mas esse tipo de situação seria o mesmo que a consumação, ou envolveria ainda os males que só seria possível através de seres humanos em um estado intermediário.
[14] Veja, por exemplo, John F. Walvoord, A Questão do Arrebatamento (Grand Rapids: Zondervan, 1979) 86-87. Paul D. Feinberg, "Um Caso para a Posição Pré-tribulacionista" em Richard R. Reiter, O Arrebatamento: Pré, Mid ou Pós-tribulacionismo? (Grand Rapids: Zondervan, 1984) 72-79.
[15] Douglas J. Moo, "Resposta" 163-65; no mesmo livro, Feinberg discute esse ponto de vista nas páginas 73-79.
[16] Em Rm 11:26 a palavra οὕτως é um obstáculo bem conhecido para o entendimento do v. 26, conforme ensinado que a conversão dos judeus é cronologicamente subseqüente à conclusão da salvação dos gentios. Zacarias 12:10-13:1 apresenta uma descrição que parece envolver eventos de toda a era escatológica, da primeira à segunda vinda de Cristo. Ap 1:7, como uma reutilização da linguagem de Zacarias, não contempla claramente a salvação dos lamentadores, mas sim a sua derrota.
[17] Richard B. Gaffin, Jr., "Teonomia e Escatologia: Reflexões sobre o Pós-milenismo", em Teonomia: Uma Crítica Reformada, William S. Barker and W. Robert Godfrey (Grand Rapids: Zondervan, 1990) 201, 208, 210.
[18] Mas a questão da esperança futura não está somente envolvida nas diferenças entre as posições sobre o milênio. Também estamos preocupados com o fato de que no presente momento já se manifesta a exaltação de Cristo - escatologia inaugurada -, e o começo do fim. Ver Gaffin, "Teonomia e Escatologia" 197-224.
[19] David Chilton, Paraíso Restaurado: Uma Escatologia de Domínio (Tyler, TX: Reconstruction Press, 1985) 120.
[20] Ibid. 119-20.
[21] Ibid. 147.
[22] Chilton (ibid. 119) quer fazer de 1ª Tessalonicenses 2:14-16 um contexto para a compreesnão de 1ª Tessalonicenses 5:1-10, mas seu apelo à 1ª Tessalonicenses 2:14-16 é muito fraco. Por um lado, 2:16 é um verso sabidamente difícil e obscuro. Ele possivelmente pode se referir a queda de Jerusalém; mas pode estar apenas se referindo ao endurecimento dos judeus, juntamente com as linhas de Rm 11:8. Além disso, o contexto imediato de 4:13-18 é decisivo para a maneira como 5:1-10 deve ser entendido; 2:14-16 é por demais remoto e carece de proeminência para que os tessalonicenses fossem conscientes de uma conexão evidente.
Resumo.
2ª Tessalonicenses 1 sustenta o amilenismo porque está em tensão com os outros principais pontos de vista sobre o milênio. Em primeiro lugar, 2ª Tessalonicenses 1 está em tensão com o pré-milenismo pré-tribulacionista e mid-tribulacionista. O texto bíblico apóia a idéia de que a segunda vinda de Cristo é um evento unificado, em vez de dois eventos cronologicamente distintos. Ou seja, o arrebatamento dos santos a o aparecimento de Cristo ocorrerão em conjunto. Os versos 6 e 7 indicam que a revelação (apokalupsis) de Cristo traz uma reversão de status. O alívio para os cristãos somente pode ser identificado com o arrebatamento. Já a perturbação para os perseguidores não envolve uma tribulação de sete anos, mas o inferno, como descrito no versículo 9. Ambos os lados dessa inversão acontece ao mesmo tempo, a saber, "no" aparecimento de Cristo descrito no verso 7b. Logo, o arrebatamento cristão e o envio dos incrédulos ao inferno tomam lugar ao mesmo tempo.
Segundo, 2ª Tessalonicenses 1 está em tensão com o pré-milenismo pós-tribulacionista. O texto revela apenas duas classes de pessoas, ou seja, cristãos e seus adversários. Na segunda vinda, cristãos se alegrarão na eterna glória (v. 10) e seus oponentes experimentarão eterna destruição no inferno (v. 9). Ambos os destinos são finais e irreversíveis. Além disso, sabemos de outras passagens que, na segunda vinda, cristãos possuem corpos ressurretos, não sujeitos a morte. Seus oponentes experimentam a morte eterna. Assim, imediatamente após a segunda vinda, não haverá seres humanos com seus corpos em um estado inacabado. Não restará ninguém para povoar um suposto milênio a fim de que mais crianças possam nascer e que seres humanos ainda continuem a experimentar uma morte física. O pré-milenismo pós-tribulacionista pode ser considerado somente através da introdução de uma terceira categoria de pessoas, que não são nem cristãos nem opositores do cristianismo. Mas a idéia de uma terceira categoria contradiz o testemunho uniforme das Escrituras, que menciona apenas duas classes de pessoas, a saber, aqueles que são de Deus e aqueles que estão contra Ele. Produzir uma terceira classe do nada também ameaça modificar a seriedade da mensagem do evangelho, introduzindo a idéia de uma "segunda chance" para esta terceira classe no milênio. Terceiro, 2ª Tessalonicenses 1 está em tensão com o pós-milenismo. O texto dos versos 5-7 indica que cristãos podem esperar problemas por algum tempo. Pós-milenistas acabam por antecipar o alívio da segunda vinda, e não apenas um tempo vindouro de prosperidade milenar, como querem que seja.
Vamos considerar separadamente como o texto bíblico conflita com o pré-milenismo pré, mid e pós-tribulacionista, bem como com o pós-milenismo. [01] Como se poderia esperar, nenhuma das questões mundiais ligadas à 2ª Tessalonicenses 1 são novas no debate sobre o milênio. Mas novos ângulos aparecem ao considerarmos como as questões mundiais interagem com uma leitura atenta do texto em questão, no contexto da Tessalônica do primeiro século.
Tensão com o pré-milenismo pré e mid-tribulacionista.
Comecemos olhando para o pré-milenismo pré e mid-tribulacional. Em ambos os pontos de vista, o arrebatamento dos santos e a manifestação de Cristo são cronologicamente distintos. Somente os santos vêem Cristo no arrebatamento, enquanto a segunda vinda visível acontece alguns anos depois. A idéia que temos aqui, de dois eventos cronologicamente separados, não é fácil de harmonizar com 2ª Tessalonicenses 1. [02]
Iniciemos com os versos 6 e 7. Estes versos indicam que a revelação (apokalupsis) de Cristo traz uma reversão de status. Aqueles que causam tribulação serão tribulados, porém, você que é tribulado experimentará alívio. "Você" significa os cristãos de Tessalônica. Paulo inclui a si mesmo e seus amigos dizendo "e a nós também." O alívio vislumbrado aqui é claramente o alívio das tribulações que os cristãos de Tessalônica e também outros cristãos estão agora experimentando nas mãos dos perseguidores.
O verso 7 especifica que esse alívio vem "quando se manifestar o Senhor Jesus desde o céu com os anjos do seu poder..." Ou seja, o alívio vem em conexão com esta revelação de Jesus Cristo. Ele vem no momento desta revelação e como um aspecto ou implicação dela. [03] Conseqüentemente, os cristãos tessalonicenses não devem concentrar suas esperanças na expectativa de alívio antes da revelação de Jesus Cristo. Outras passagens afirmam a idéia geral de que cristãos devem esperar por sofrimento e perseguição neste mundo (1ªTs 3:4, 2:14; 2ª Tm 3:1-13, 4:4-5; At 14:22; 1ª Pe 4:1-5, 12-19).
O momento em que os cristãos experimentarão alívio só pode ser identificado com o arrebatamento (como em 1ª Tessalonicenses 4:13-18). Paulo espera que as tribulações continuarão até o arrebatamento. Não haverá mais tribulação para os cristãos depois de serem arrebatados. Quaisquer que sejam os detalhes sobre a segunda vinda de Cristo, a transição fundamental para os cristãos ocorrerá quando o rapto lhes trouxer alívio das tribulações.
Antes de prosseguirmos, devemos lidar rapidamente com uma dificuldade ocasional. Vivendo no século XX, sabemos que os cristãos tessalonicenses, bem como Paulo e seus amigos, morreram antes da segunda vinda ocorrer. Na realidade, eles tiveram um certo "alívio" de suas tribulações quando morreram, em vez de no arrebatamento. [04]
Como podemos lidar com essa dificuldade? Devemos lembrar que, embora Paulo tenha escrito sob a inspiração do Espírito Santo, o Espírito não revelou a ele ou a qualquer outro a época da segunda vinda (Marcos 13:32; Atos 1:7). Por isso Paulo fala como alguém que poderia estar vivo no momento da segunda vinda (1ª Ts 4:15; 1ª Co 15:510. Além disso, os tessalonicenses sabiam que alguns cristãos já haviam morrido, e muitos morreriam se a vinda de Cristo ainda estivesse longe de acontecer (1ª Ts 4:13-14). Muito apropriadamente, Paulo não concentrou suas esperanças na possibilidade da sua morte certa, mas na certeza do arrebatamento. A morte é apenas um "alívio" parcial e ambíguo; o verdadeiro alívio vem com a ressurreição do corpo (1ª Ts 4:13-18; 2ª Co 5:4; 1ª Co 15:51-57). Portanto, em 2ª Tessalonicenses 1 Paulo fala como alguém que tem seu foco na segunda vinda. Se Paulo tivesse incluído algumas qualificações técnicas sobre o fato de que alguns cristãos podem morrer antes da segunda vinda, ele estaria se desviando do ponto principal. Por outro lado, Paulo já havia explicado este tipo de qualificação complexa aos tessalonicenses em 1ª Ts 4:13-18. [05] Concluímos, então, que 2ª Tessalonicenses 1 aplica-se eminentemente a todos os cristãos que estiverem vivos no momento da segunda vinda. Mas, secundariamente, o texto se aplica a todos os que morreram no que diz respeito ao corpo e aguardam a ressurreição. Há muito tempo eles esperam pela segunda vinda, como em Ap 6:9-10.
Com essa questão resolvida, podemos volta a considerar o ensino de 2ª Tessalonicenses 1. O uso específico da linguagem nos versos 7-10 indica que este momento de alívio é o momento da manifestação de Cristo. É a "revelação (apokalupsei, ἀποκαλύψει) do Senhor Jesus desde o céu com os anjos do seu poder, como labareda de fogo, tomando vingança dos que não conhecem a Deus..." Para um leitor habitual, esta descrição certamente soa como uma segunda vinda pública e visível. A "revelação" não é apenas visível para os santos, mas é uma revelação que inclui chamas flamejantes para tomar vingança dos inimigos de Deus.
Além disso, no A.T. a "revelação" ou manifestação de Deus é regularmente o primeiro evento na guerra santa. Deus aparece em glória e poder para lutar contra os seus inimigos (Zc 14:3-4, 9:14-16; Is 63:1, 66:15-16; Hc 3:3-15; etc.). [06] Vingança é uma conseqüência da Sua manifestação. Esse mesmo padrão é evidente em 2ª Ts 1:7-8, onde a vingança acompanha a presença de Deus. Deus aparece acompanhado de anjos e fogo, e de acordo com a perspectiva bíblica, os anjos e fogo estão integralmente envolvidos como instrumentos na execução da vingança.
Assim, o arrebatamento dos santos, o ponto em que acontece o alívio, acontece "na" revelação pública de Jesus Cristo. Os dois eventos - o arrebatamento e a revelação - são basicamente simultâneos, e são dois aspectos de uma revelação de Jesus Cristo.
Os defensores do pré e mid-tribulacionismo têm uma dificuldade aqui. Eles podem argumentar que, a despeito da linguagem forte dos versos 7-8, o aparecimento de Cristo tem que acontecer somente para os cristãos. A descrição aqui relata apenas o arrebatamento - eles dizem -, não a segunda vinda pública. [07] Mas em seu argumento eles separam o aparecimento (que dizem ser somente para os cristãos) dos ato de vingança (que é dirigido aos não cristãos). Tal separação é completamente artificial. Deus aparece a seus inimigos, julgando-os e punindo-os. O A.T. mostra uma ligação regular teológica e causal entre os dois em suas descrições do dia do Senhor.
Mesmo se admitirmos ao pré e mid-tribulacionismo a possibilidade de uma separação, eles ainda não escapam de todas as dificuldades. A simetria nos versos 6-7 indica que a revelação de Jesus Cristo tem dois lados. [08] Um dos lados envolve alívio para os cristãos (o arrebatamento). O outro lado envolve punição aos seus adversários. De acordo com as posições pré e mid-tribulacionista, a punição é a Grande Tribulação propriamente dita. Mas não é isso que 2ª Tessalonicense 1 diz. Os oponentes receberão "vingança" em conexão com a chama flamejante do aparecimento de Cristo (v. 8). Esta vingança é ainda definida no verso 9 como "eterna perdição, ante a face do Senhor e a glória do seu poder." O verso 9 está falando sobre o castigo no inferno, não em algum período de tribulação. Note também a ligação entre a presença do Senhor no v. 9 e Sua revelação no v. 7, entre a punição (diken, δίκην) no v. 9 e a vingança (ekdikesin, ἐκδίκησιν) no v. 8, entre "Seu poder" no v. 9 e os "anjos poderosos" no v. 7. [09] Os vínculos são estreitos demais para tentar desajeitadamente distinguir dois estágios diferentes aqui. Os cristãos de Tessalônica certamente entenderam a descrição como uma imagem unificada, de acordo com as imagens unificadas do "dia do Senhor" no A.T.
A unidade cronológica dos acontecimentos é reforçada pela conjunção "quando" (hotan, ὅταν) no início do verso 10. Os versos 9 e 10 nos oferecem a mesma antítese simétrica como o fazem os versos 6-7. Nos versos 9 e 10 os santos [10] experimentam alívio e reivindicação, enquanto os ímpios experimentam o inferno. Os dois julgamentos são simultâneos ("quando"), assim como a reversão nos versos 6-7 envolve simultaneidade no alívio para os santos e na punição para os seus adversários.
Resumindo, o lançamento dos incrédulos ao inferno é simultâneo com o alívio dos cristãos no arrebatamento. Não há estágio intermediário de tribulação entre os dois eventos.
Portanto, o arrebatamento dos santos e a manifestação pública de Cristo ocorrerão em conjunto. 2ª Tessalonicenses está em tensão neste ponto o pré-milenismo pré e mid-tribulacionista.
Talvez a melhor resposta para essa interpretação é oferecida por Paul D. Feinberg. [11] Ele observa que a revelação de Cristo em 2ª Ts 1:7 poderia...
..."ser entendida como todo o complexo de eventos, começando com o arrebatamento e terminando com o segundo advento."A passagem reúne...
..."as várias fases dos acontecimentos do fim dos tempos. Esta associação de eventos não é incomum nos textos proféticos."Feinberg praticamente admiti que 2ª Tessalonicenses entrelaça todos os eventos juntos. Com base em 2ª Ts 1, os cristãos de Tessalônica teriam entendido a segunda vinda como um evento unificado.
Tensão com o pré-milenismo histórico.
Agora, consideremos o pré-milenismo histórico, ou pré-milenismo clássico. Nesta perspectiva, a segunda vinda é um único evento unificado. Após este evento inicia-se um período milenar de paz e prosperidade, durante o qual as pessoas continuam a ter filhos e são afetadas pela morte.
2ª Tessalonicenses 1 cria dificuldades para essa posição também. O texto apresenta somente duas classes de pessoas, a saber, os cristãos e seus adversários. Tecnicamente falando, no versículo 6 Paulo menciona somente os perseguidores, não todos os incrédulos. [12] Mas a perseguição é apenas a forma mais virulenta de rejeição à Deus que caracteriza todos os não-cristãos (Ef 4:17-19, 2:1-3; Rm 3:9-20). Por isso, a princípio, a descrição de Paulo se aplica ao grupo mais amplo. No verso 8, a descrição, na realidade, toma proporções maiores. A retribuição vem para aqueles "que não conhecem a Deus e os que não obedecem ao evangelho de nosso Senhor Jesus."
Em suma, na segunda vinda os cristãos desfrutam a glória eterna (v. 10) e os não-cristãos experimentam a destruição eterna no inferno (v. 9). Ambos os destinos são finais e irreversíveis. Além disso, sabemos de outras passagens em que cristãos possuem corpos ressuscitados, não sujeitos à morte. Não-cristãos conhecem a morte eterna. Conseqüentemente, não há seres humanos deixados com corpos em um estado intermediário. Não haverá ninguém para povoar um suposto milênio, onde mais crianças nascem e seres humanos ainda experimentam a morte física. [13] Curiosamente, pré-tribulacionistas estão bem cientes dessa dificuldade, e usam ela como um argumento contra o pós-tribulacionismo. [14] A inexistência de qualquer ser humano em uma categoria intermediária não é meramente uma dificuldade técnica incidental. A totalidade da Bíblia ensina que as pessoas estão com Deus ou contra Ele. Não há neutralidade na batalha espiritual descrita em Efésios 6:10-20, 1ª João 5:18-21, e Apocalipse.
O evangelho em si está em jogo nesta questão. O único remédio para o pecado e rebelião espiritual encontra-se no sacrifício de Jesus Cristo. Se você está unido em Cristo, você está redimido. Se você não está unido, então você não está redimido. Na segunda vinda, aqueles que estão unidos em Cristo receberão corpos ressurretos, e aqueles que não estão unidos irão para o inferno. Não há uma terceira categoria; não haverá pessoas em uma terra-sem-ninguém. Cristo é o único redentor (Atos 4:12). "Quem não está comigo, é contra mim," Ele diz (Mt 12:30). "Quem tem o Filho tem a vida; quem não tem o Filho de Deus não tem a vida." (1ª Jo 5:12). Portanto, não é possível introduzir uma terceira categoria hipotética sem violentar as verdades centrais do evangelho.
Ainda, o pré-milenismo pós-tribulacionista tem comumente sugerido a partir de textos como Zc 12:10-13:1, Rm 11:26, e Ap 1:7 que numerosos judeus depositarão sua fé em Cristo no momento do Seu aparecimento. [15] À primeira vista, essa teoria parece oferecer uma saída eficiente. Mas há problemas com ela.
Primeiro, não é claro que a teoria pode ser conciliada com 2ª Tessalonicenses 1, uma vez que o texto opera claramente em termos de duas categorias de pessoas. Segundo, nenhum dos textos oferecidos para apoiar tal teoria menciona claramente uma conversão dos judeus no mesmo momento do aparecimento visível de Cristo ao invés de antes dele. [16] Terceiro, nem essas nem outras passagens bíblicas contêm alguma sugestão que possa nos encorajar a quebrar a dicotomia fundamental entre salvos e perdidos. Quarto, nenhuma passagem no Novo Testamento incentiva-nos a introduzir uma idéia pastoralmente perigosa, de que o aparecimento final de Cristo permitirá uma "segunda chance" de salvação e não o encerramento do tempo da salvação. Logo, se os judeus são salvos por Cristo, gozam os mesmos privilégios como todos os salvos, ou seja, a ressurreição do corpo na vinda do Senhor Jesus.
Tensões com o pós-milenismo.
Finalmente, vamos considerar o pós-milenismo. Ele diz que, através do evangelho, a fidelidade à Cristo e a obediência cristã irão se espalhar gradualmente pelo mundo até que a grande maioria das pessoas se tornem cristãs. Sociedades e suas instituições serão progressivamente conformadas à vontade de Deus, e uma era de grande paz e prosperidade seguir-se-á antes da segunda vinda.
Em minha opinião, existe a possibilidade disso acontecer. De fato, porque eu fico impressionado com o poder de Deus para a salvação no evangelho (Rm 1:16), eu estou otimista quanto ao futuro. Cristo pode retornar muito em breve, mas se Ele não o fizer nos próximo cem anos, podemos ver uma grande colheita para o evangelho. Alguns outros amilenistas mostram o mesmo otimismo. [17]
Qual é, então, a diferença entre este tipo de "amilenismo otimista" e um pós-milenismo desenvolvido? Existe alguma diferença significativa entre eles?
2ª Tessalonicense 1 contribui para indicar uma diferença remanescente. O texto, eu afirmo, nos pede para concentrar nossa esperança na segunda vinda de Cristo, não em uma prosperidade milenar hipotética tomando lugar antes da segunda vinda. O restante do Novo Testamento tem um enfoque similar. Assim, na minha opinião, o problema principal que atualmente separa amilenistas de pós-milenistas não é uma questão de mera possibilidade, ou seja, o que possivelmente pode acontecer se o retorno de Cristo está ainda a algumas décadas de distância. Ao contrário, a questão é saber se a promessa e a profecia bíblica convidam os cristãos a concentrar a esperança sobre a possibilidade de um milênio. Será que tal prosperidade é o foco principal da expectativa profética, e que ela é certamente garantida pela profecia? Pós-milenistas dizem que sim, e com base nisso eles esperam confiantemente que a segunda vinda está ainda longe de acontecer. Logo, eles se encontram teologicamente inapropriados e psicologicamente impossíveis de concentrar suas esperanças primariamente sobre a segunda vinda. Em contraste, pré-milenistas e amilenistas pensam que a segunda vinda é o próximo evento principal no plano de Deus para a história. Pode ser muito em breve, e esperamos e oramos para que o Senhor venha. [18]
Agora considere 2ª Tessalonicenses 1. Ele está em tensão com o pós-milenismo, na medida em que pós-milenistas querem concentrar suas esperanças sobre a vinda de uma prosperidade milenar. O texto dos versos 5-7 indica que os cristãos podem continuar esperando problemas por algum tempo. Mas, conforme querem que aconteça, eles não apenas esperam um tempo de prosperidade milenar, mas antecipam o alívio da segunda vinda.
Certamente, perseguições vêm e vão, como pode ser visto na história do reino do norte de Israel, bem como no livro de Atos. Algumas vezes os cristãos podem ter uma porção de "alívio" quando diminui a perseguição, ou quando a perseguição toma formas mais "civilizadas". Mas o foco da nossa esperança, de acordo com 2ª Ts 1, está na segunda vinda de Cristo. Se os problemas variam de forma ou se cristãos podem, por vezes, esperar estar em superioridade numérica, é um ponto de vista teológico de interesse meramente secundário.
Alguns pós-milenistas têm se esforçado para fugir das implicações de 2ª Ts 1, insistindo que o texto está realmente descrevendo a queda de Jerusalém em 70 d.C., ao invés de a segunda vinda. [19] De acordo com David Chilton e alguns outros pós-milenistas contemporâneos, não só 2ª Tessalonicenses, mas a maioria das outras passagens neotestamentárias que têm sido tradicionalmente entendidas como descrevendo a segunda vinda, estão na verdade descrevendo a queda de Jerusalém em 70 d.C. Para ele a linguagem é figurada e não literal. Chilton aplica um procedimento similar em 1ª Ts 5:1-9. [20] Mas ele acredita que 1ª Ts 4:13-18 e 1ª Co 15:51-58 falam sobre a segunda vinda. [21]
Não podemos entrar em todos os detalhes do sistema de Chilton neste momento. Mas afirmamos que este tipo de abordagem não pode ser razoavelmente sustentado no tratamento que faz da carta. 1ª Ts 4:13-18 é sobre a segunda vinda. 1ª Ts 5:1-10, que está logo à frente, também deve ser sobre a segunda vinda. Assim, 2ª Tessalonicenses 1, que se baseia em 1ª Tessalonicenses, é também sobre a segunda vinda. Nada nas cartas possui qualquer tendência real em apontar para uma direção diferente a partir deste entendimento.
Chilton e outros como ele podem encontrar o que querem nas cartas aos tessalonicenses somente porque lêem o texto com uma idéia previamente concebida. Mas suas interpretações se desintegram quando tentamos firmemente nos colocar no lugar dos cristãos de Tessalônica. Paulo esteve naquela cidade por algumas semanas (Atos 17:1-10). Além disso, mesmo Paulo tendo falado à eles sobre a segunda vinda (2ª Ts 2:5), as cartas mostram que aqueles cristãos estavam confusos. Eles não compreendiam muito bem questões relativamente básicas de escatologia. Os tessalonicenses não tinham ainda um conhecimento profundo de algum sistema escatológico. Então, Paulo entendeu a situação dos tessalonicenses e suas limitações. Ele não teria usado uma linguagem de tal forma que aqueles cristãos quase que certamente não compreenderiam.
Uma vez que entendemos o nível em que Paulo deve ter comunicado a eles, segue-se que 1ª Ts 4:13-18 é sobre a segunda vinda. A transição em 5:1 não é violenta. Assim, os tessalonicenses entenderam os "tempos e épocas" de 5:1 como os tempos e épocas a respeito dos eventos associados com a segunda vinda. Por conseguinte, 5:1-10 é sobre a segunda vinda. [22]
Prosseguindo, 1ª Tessalonicenses é o cenário principal para 2ª Tessalonicenses. Tendo em vista a preocupação concernente à segunda vinda em 1ª Ts, os cristãos de Tessalônica são obrigados a entender 2ª Ts como uma continuação do mesmo tema. A questão não é se podemos inventar um esquema interpretativo, como Chilton o faz, capaz de interpretar toda a passagem em sentido figurado. A questão é se os tessalonicenses possuem alguma pista significativa que poderia levá-los a se afastar do que, do ponto de vista deles, é o sentido mais óbvio.
Portanto, não há como escapar do fato de que do ponto de vista dos cristãos de Tessalônica, 2ª Ts 1 é "obviamente" sobre a segunda vinda. Paulo sabia da capacidade dos tessalonicenses e não pretendia confundi-los. Assim, Paulo realmente estava falando sobre a segunda vinda.
Mas Chilton (p. 120) tem um outro argumento:
"Claramente, Paulo não está falando da vinda final de Cristo no fim do mundo, e sim que a vinda da "tribulação" e "vingança" estava destinada especificamente para aqueles que perseguiam os cristãos tessalonicenses da primeira geração. O vindouro dia do julgamento não era algo para acontecer milhares de anos depois."Chilton, de sua "confiável" posição vantajosa séculos mais tarde, conclui que a segunda vinda foi a milhares de anos atrás. Assim, Paulo não poderia estar se referindo à segunda vinda em um futuro distante. Mas, infelizmente, nem Paulo nem os tessalonicenses tinham o mesmo conhecimento que Chilton tem agora. Nem Paulo nem os tessalonicenses sabiam o quão longe a segunda vinda poderia estar. O que todos eles sabiam é que poderiam estar vivos quando o Senhor retornasse (1ª Ts 4:15, 18; 1ª Co 15:51). Então, é perfeitamente apropriado para eles olhar à frente, para a segunda vinda, como o tempo da vingança e reivindicação. A interpretação de Chilton só funciona projetando seu ponto de vista sobre os tessalonicenses. Fica evidente, a partir da natureza do argumento de Chilton, que ele não se colocou no lugar dos tessalonicenses; ele não levou a sério a exegese gramático-histórica.
Ainda, do ponto de vista dos cristãos do primeiro século, independentemente se esperamos um curto ou longo período de tempo para a segunda vinda de Cristo, o julgamento fundamental ocorre na segunda vinda, não apenas na morte ou através de alguma calamidade histórica do passado. Deste modo, o princípio que Paulo expressa em 2ª Tessalonicenses 1 é válido não somente para os tessalonicenses, mas para todos os cristãos que estão sofrendo perseguição.
Lições de hermenêutica.
Curiosamente, um dispensacionalista como Walvoord (A Questão do Arrebatamento, 235-245) e um pós-milenista como Chilton mostram similaridades aqui. Ambos apelam ao fato de que a segunda vinda não aconteceu no primeiro século, a fim de invalidar a referência de 1:7-10 para a segunda vinda. Ambos interpretam 2ª Ts 1 dentro de uma complexa e totalmente articulada posição escatológica, tendo pouca consideração pelos leitores tessalonicenses que não eram tão sofisticados como eles.
A forma do argumento aqui nos alerta para os problemas que todos nós enfrentamos com respeito à circularidades na interpretação bíblica. É fácil para todos nós assumirmos que Paulo e os tessalonicenses tinham crenças exatamente como as nossas. Ou seja, nós inferimos que o Apóstolo Paulo ensinou aos cristãos de Tessalônica precisamente o que nós mesmos acreditamos. Se admitimos isso, presumimos que os tessalonicenses sabiam o que sabemos, e que eles entendiam naturalmente a carta de Paulo da mesma forma que nós entendemos. Por isso, 2ª Tessalonicenses significa exatamente o que já sabíamos que significava. Desse modo, o texto bíblico confirma nosso ponto de vista.
Lamentavelmente, tal argumento é falacioso. Qual é o resultado final de usar este princípio? Por mais estranha ou forçada que nossa interpretação moderna possa ser, podemos ainda nos assegurar de que o entendimento dos tessalonicenses corresponde à nossa própria interpretação. Afinal, os tessalonicenses sabiam o que Paulo realmente queria dizer, porque puderam colocar seu ensinamento em uma estrutura já bem estabelecida pelo seu ensinamento oral (o qual era naturalmente o mesmo que nossa própria visão moderna).
A alegação de que os tessalonicenses tinham uma estrutura completa e sofisticada parece atraente porque ela ajuda a proteger nossas posições modernas; mas é perigosamente circular e, creio eu, improvável, à luz da falta de entendimento daqueles cristãos e da estadia curta de Paulo em Tessalônica.
Voltando à questão do arrebatamento.
Essas observações hermenêuticas têm relevância para 1ª Ts 4:13-5:10, bem como para 2ª Ts 1. De que maneira?
Eu concordo que 1ª Ts 4:13-18 diz respeito ao arrebatamento. Mas Pré e mid-tribulacionistas têm geralmente pensado que 1ª Ts 5:1-10 diz respeito ao "dia do Senhor", que inclui tanto a Grande Tribulação e a segunda vinda visível. Na opinião deles, existem dois ou mais eventos cronologicamente distintos aqui. Se realmente pudéssemos separar dois ou mais eventos distintos por meio destas passagens de 1ª Tessalonicenses, teríamos, pelo menos, que ter alguma base para afirmar que aqueles cristãos já compreendiam o pré-tribulacionismo quando receberam a segunda carta. Nesse caso, 2ª Tessalonicenses seria então confusa aos cristãos de Tessalônica, mas não o suficiente para derrubar o entendimento que eles já possuíam.
A idéia de que 1ª Ts 4:13-5:10 lida com dois eventos separados cronologicamente tem seus próprios problemas. Ao interpretar estes versos, novamente corremos o perigo de assumir que os cristãos de Tessalônica tinham o conhecimento de um sistema completo antes mesmo de receberam a carta de Paulo. Por exemplo, podemos realmente presumir que os tessalonicenses já teriam se familiarizado com as distinções dispensacionalistas modernas sobre dois estágios? Ou será que eles agiram instintivamente, como um dispensacionalista moderno faz, com uma nítida distinção entre tribulação (amplamente concebida) e a Grande Tribulação? Será que eles distinguiam conscientemente entre ser removido da tribulação versus ser preservado e protegido, como eles mesmo passaram por isso? Será que eles viram uma palavra como "ira" (5:9) como uma alusão à Tribulação em distinção do julgamento final? A menos que os tessalonicenses fossem auxiliados por um sistema escatológico completo, os dispensacionalistas realmente possuem indícios para dizer-lhes que 1ª Ts 4:13-5:10 diz respeito a dois eventos sucessivos, ao invés de dois aspectos de um único evento?
Neste artigo, não podemos explorar em detalhes a interpretação de 1ª Ts 4:13-5:10, mas devemos estar conscientes de que algumas das mesmas circularidades hermenêuticas podem surgir, assim como em 2ª Tessalonicenses 1.
Traduzido por Mac.
Veja também este artigo original em inglês: http://www.frame-poythress.org/poythress_articles/19952Thessalonians.htm
[01] Para resumos úteis das principais posições, ver Robert G. Clouse, O Significado do Milênio: Quatro Pontos de Vista (Downers Grove: InterVarsity, 1977); Millard J. Erickson, Opções Contemporâneas de Escatologia: Um Estudo do Milênio (Grand Rapids: Baker, 1977); Richard R. Reiter, Paul D. Feinberg, Gleason L. Archer, e Douglas J. Moo, O Arrebatamento: Pré, Mid, ou Pós-tribulacionismo? (Grand Rapids: Zondervan, 1984).
[02] Meu argumento sobre este ponto é substancialmente o mesmo que o de Douglas J. Moo, "The Case for the Posttribulation Rapture Position", em Reiter, O Arrebatamento 187-88.
[03] Leon Morris, A Primeira e Segunda Epístolas aos Tessalonicenses (Grand Rapids: Eerdmans, 1991) 201n25.
[04] John F. Walvoord (A Bendita Esperança e a Tribulação: Um Estudo Bíblico e Histórico do Pós-tribulacionismo [Grand Rapids: Zondervan, 1976] 123-24; e A Questão do Arrebatamento [Grand Rapids: Zondervan, 1979] 236-37) conclui sobre esta base que 2ª Tessalonicenses 1 não pode ser todo sobre o arrebatamento. Tudo em 1:7b-10 descreve um julgamento no final do milênio. Mas ele não oferece nenhuma explicação da palavra ἐν no verso 7, que relaciona temporariamente as descrições dos versos 7b-10 com alívio aos tessalonicenses.
[05] Assim como a maior parte da erudição do Novo Testamento, eu acredito que 1ª Tessalonicenses foi escrita anteriormente à 2ª Tessalonicenses. Eu assumo também, sobre a base da afirmação explícita de 2ª Tessalonicenses, que Paulo é o verdadeiro autor (não uma carta pseudoepígrafa).
[06] Conferir, por exemplo, Tremper Longman, III, "The Divine Warrior: The New Testament Use of an Old Testament Motif," WTJ 44 (1982) 290-307; notar também que Is 66:15-16 LXX oferece um dos mais significativos antecedentes textuais para os versículos 7-8. Conferir Charles A. Wanamaker, As Espítolas aos Tessalonicenses (Grand Rapids: Eerdmans, 1990) 226-227; FF Bruce, Comentário Bíblico Mundial: Volume 45: 1 & 2 Tessalonicenses (Waco, TX: Word Books, 1982) 151.
[07] Paul D. Feinberg, "Resposta", em Reiter, Arrebatamento 227, menciona brevemente esta possibilidade.
[08] Charles A. Wanamaker, As Epístolas aos Tessalonicenses (Grand Rapids: Eerdmans, 1990) 223-224.
[09] Cf. Wanamaker, As Epístolas aos Tessalonicenses 228.
[10] "Santos" no v. 10 refere-se aos cristãos, e não aos anjos, como a frase paralela "em todos os que creram" deixa claro. Earnest Best, Um Comentário sobre a Primeira e Segunda Epístolas aos Tessalonicenses (New York: Harper & Row, 1972) 265.
[11] Feinberg, "Resposta", em Reiter, Arrebatamento 227.
[12] Melhor Assim, Tessalonicenses 262-263.
[13] Douglas Moo brevemente comenta a possibilidade de um "milênio" sem a morte física (Moo, "Resposta", em Reiter, Arrebatamento 162). Mas esse tipo de situação seria o mesmo que a consumação, ou envolveria ainda os males que só seria possível através de seres humanos em um estado intermediário.
[14] Veja, por exemplo, John F. Walvoord, A Questão do Arrebatamento (Grand Rapids: Zondervan, 1979) 86-87. Paul D. Feinberg, "Um Caso para a Posição Pré-tribulacionista" em Richard R. Reiter, O Arrebatamento: Pré, Mid ou Pós-tribulacionismo? (Grand Rapids: Zondervan, 1984) 72-79.
[15] Douglas J. Moo, "Resposta" 163-65; no mesmo livro, Feinberg discute esse ponto de vista nas páginas 73-79.
[16] Em Rm 11:26 a palavra οὕτως é um obstáculo bem conhecido para o entendimento do v. 26, conforme ensinado que a conversão dos judeus é cronologicamente subseqüente à conclusão da salvação dos gentios. Zacarias 12:10-13:1 apresenta uma descrição que parece envolver eventos de toda a era escatológica, da primeira à segunda vinda de Cristo. Ap 1:7, como uma reutilização da linguagem de Zacarias, não contempla claramente a salvação dos lamentadores, mas sim a sua derrota.
[17] Richard B. Gaffin, Jr., "Teonomia e Escatologia: Reflexões sobre o Pós-milenismo", em Teonomia: Uma Crítica Reformada, William S. Barker and W. Robert Godfrey (Grand Rapids: Zondervan, 1990) 201, 208, 210.
[18] Mas a questão da esperança futura não está somente envolvida nas diferenças entre as posições sobre o milênio. Também estamos preocupados com o fato de que no presente momento já se manifesta a exaltação de Cristo - escatologia inaugurada -, e o começo do fim. Ver Gaffin, "Teonomia e Escatologia" 197-224.
[19] David Chilton, Paraíso Restaurado: Uma Escatologia de Domínio (Tyler, TX: Reconstruction Press, 1985) 120.
[20] Ibid. 119-20.
[21] Ibid. 147.
[22] Chilton (ibid. 119) quer fazer de 1ª Tessalonicenses 2:14-16 um contexto para a compreesnão de 1ª Tessalonicenses 5:1-10, mas seu apelo à 1ª Tessalonicenses 2:14-16 é muito fraco. Por um lado, 2:16 é um verso sabidamente difícil e obscuro. Ele possivelmente pode se referir a queda de Jerusalém; mas pode estar apenas se referindo ao endurecimento dos judeus, juntamente com as linhas de Rm 11:8. Além disso, o contexto imediato de 4:13-18 é decisivo para a maneira como 5:1-10 deve ser entendido; 2:14-16 é por demais remoto e carece de proeminência para que os tessalonicenses fossem conscientes de uma conexão evidente.
Bom dia!
ResponderExcluirO autor do post escreveu...
2ª Tessalonicenses 1 sustenta o amilenismo porque está em tensão com os outros principais pontos de vista sobre o milênio. Em primeiro lugar, 2ª Tessalonicenses 1 está em tensão com o pré-milenismo pré-tribulacionista...
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Amigo, onde que 2ª Tessalonicenses 1 sustenta o amilenismo? Pelo contrário, esse capitulo 1 põe por terra o amilenismo!
Em 2Tes. 1:4, Paulo está tratando da esperança futura do cristão, o Reinado literal de Cristo e a Igreja sobre a terra, por mil anos. Promessa essa, conhecida de cor e salteado, por todos os israelitas da sua época, nos Salmos, em Isaías e nos demais profetas.
Em razão disso, diante das perseguições do seu tempo, eles (assim como nós hoje), pacientemente, AGUARDAVAM PELA FÉ... ”para serem havidos por dignos do Reino de Deus” !Tes. 1:5.
Ou seja: Participantes DO REINO LITERAL FUTURO DE CRISTO NA TERRA; bem como DA RESTAURAÇÃO DA NAÇÃO DE ISRAEL.
“Aqueles, pois, que se haviam reunido perguntaram-lhe, dizendo: Senhor, RESTAURARÁS TU NESSE TEMPO O REINO A ISRAEL? Atos. 1:6.
Jaime e Júlio = Curitiba Pr. – estudos e gráficos escatológicos, muito além das teologias convencionais. E-mail: Jaime.ap@hotmail.com
Bem viajado o autor do comentário acima, hein? Ele vê um reino milenar em qualquer lugar em que apareça a expressão "reino de Deus". Refutou todo o texto. Kkkkkk
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