IMPORTANTE: O texto a seguir é de autoria de Robert B. Strimple, professor de Teologia Sistemática no Westminster Theological Seminary.
Se somos filhos, então somos herdeiros – herdeiros de Deus e co-herdeiros com Cristo, se de fato participamos dos seus sofrimentos, para que também participemos da sua glória.Aqui, o apóstolo afirma o ardente desejo dos crentes em Cristo e de toda a criação, pela prometida glória vindoura. Ele também fala dos sofrimentos do tempo presente e da glória que nos será revelada. A versão NVI – “nossos sofrimentos atuais” – obscurece, talvez, o ímpeto do contraste apostólico, que é “não [um contraste] entre sofrimentos suportados pelo crente nesta vida antes da morte, e a felicidade que desfruta na morte”.[18] A frase “até agora” é outra maneira de se referir ao período de que Paulo relata em outro lugar como “deste mundo” ou “desta presente era” (Rm 12.2; Gl 1.4; Ef 1.21). O contraste, em outras palavras, é entre os sofrimentos que caracterizam esta era e a glória que caracterizará a próxima era, a era vindoura.
Considero que todos os nossos sofrimentos atuais não podem ser comparados com a glória que em nós será revelada. A natureza criada aguarda, com grande expectativa, que os filhos de Deus sejam revelados. Pois ela foi submetida à inutilidade, não pela sua própria escolha, mas por causa da vontade daquele que a sujeitou, na esperança de que a própria natureza criada será libertada da escravidão da decadência em que se encontra, recebendo a gloriosa liberdade dos filhos de Deus.
Sabemos que toda a natureza criada geme até agora, como em dores de parto. E não só isso, mas nós mesmos, que temos os primeiros frutos do Espírito, gememos interiormente, esperando ansiosamente nossa adoção como filhos, a redenção do nosso corpo.
Falando da “natureza criada”, o apóstolo utiliza uma figura de linguagem chamada “personificação”; isto é, ele fala do cosmos material como se esse fosse uma pessoa pensante, sensível e volitiva. Não apenas os crentes que “gemem” com “grande expectativa” da glória vindoura, mas também “toda a natureza criada”. A criação ficou sujeita à esterilidade, deterioração e decadência envolvidas na maldição pronunciada no Éden por causa do pecado de Adão (Gn 3.17,18). O que a sujeitou “na esperança” (Rm 8.20) foi Deus. E a “esperança” de que Paulo fala é a esperança da renovação cósmica prometida em outro lugar na Bíblia: “a regeneração [renovação] de todas as coisas” (Mt 19.28); “o tempo em que Deus restaurará todas as coisas“ (At 3.21); “novos céus e nova Terra” (2Pe 3.13; Ap 21.1; v. Is 65.17; 66.22).
Ou seja, essas são “as dores de parto” de que Paulo fala em Romanos 8.22; elas não são dores de morte. Este mundo será renovado e não aniquilado. Caso contrário, Paulo não poderia ter dito que ele ficou sujeito “em esperança” (8.24,25). Eis por que deveríamos falar de renovação cósmica em vez de destruição cósmica. Pense no paralelo que Pedro faz entre o juízo futuro e antigo juízo do Dilúvio: “O mundo daquele tempo foi [...] destruído”, mas certamente não aniquilado (2Pe 3.6). Compare a imagem que Paulo faz do cristão como um “novo homem” (Ef 4.24; Cl 3.10 KJV), e como uma “nova criação” (Gl 6.15). O novo ser é o antigo feito novo.
O cristão não é uma nova pessoa no sentido absoluto, como se Deus houvesse escolhido criar um povo para si mesmo a partir do ar rarefeito ou das pedras da margem da estrada. Jesus disse que Deus poderia fazer isso (Mt 3.9), mas ele preferiu não fazê-lo. Antes, pelo poder do Espírito de Cristo, ele escolheu fazer novos os pecadores perdidos. A renovação do cosmos é comparável à ressurreição do corpo. E quão novo será esse corpo - tão diferente de nosso corpo presente como o grão que surge da semente que foi semeada (1Co 15.35-44). Contudo, Paulo indica que haverá uma conexão (embora ela possa ser misteriosa à nossa mente) para os nossos corpos atuais. Todavia, esse milagre não poderia ser descrito como uma “ressurreição” de nossos corpos.
Paulo retrata de forma expressiva o ansioso desejo dos crentes e de toda a criação e ele se regozija no fato de que esse desejo será satisfeito; os justos e a criação conhecerão uma segura e completa libertação.
Paulo expressa esse futuro livramento do povo de Deus de vários modos. Ele fala da glorificação com Cristo (Rm 8.17), “a glória que em nós será revelada” (v. 18), a revelação dos filhos de Deus (v. 19), “gloriosa liberdade dos filhos de Deus” (v. 21), “nossa adoção como filhos, a redenção do nosso corpo” (v. 23). Todos esses termos falam da libertação completa do pecado e dos seus resultados maravilhosos advindos dessa libertação.
Paulo nos fala aqui sobre quando essa libertação total será nossa – na ressurreição. Ele a chama de “a redenção de nosso corpo”, o grande objetivo para o qual os crentes receberam o selo do Espírito Santo como depósito, “a garantia da nossa herança até a redenção daqueles que pertencem a Deus” (Ef 1.14). O apóstolo também se refere a ela como “nossa adoção”, porque as implicações completas da bendita adoção que já desfrutamos em união com o Filho de Deus serão efetivadas só naquele momento. E, como veremos, Paulo ensina claramente em 1Coríntios 15.23 que a ressurreição dos que pertencem a Cristo ocorrerá na vinda de Cristo [parousia].
Paulo descreve a libertação da criação como o resgate “da escravidão da decadência [...] a gloriosa liberdade dos filhos de Deus” (Rm 8.21). Assim, o livramento da criação de todas as corruptoras conseqüências do pecado humano que a afetaram será tão completa e final quanto a libertação do povo de Deus do pecado e suas conseqüências.
Aqui novamente o apóstolo dirige nossa atenção para o tempo em que essa libertação será realizada: quando “os filhos de Deus [forem] revelados” (Rm 8.19). O dia de sua “revelação” [apokalypsis] como filhos de Deus é a gloriosa meta da expectação dos crentes, e também a expectante meta da criação. Nesse tempo, a própria criação será libertada “da escravidão da decadência em que se encontra, recebendo a gloriosa liberdade dos filhos de Deus” (v. 21). A “revelação dos filhos de Deus” e “a gloriosa liberdade dos filhos de Deus” não podem ser adiadas para além da vinda de Cristo e da ressurreição, nem o livramento da criação posposto ao grande dia.
Isso é descartado pelos versículos 22 e 23, nos quais vemos os crentes e toda a criação gemendo juntos e esperando pela adoção que aqui é definida como “a redenção de nossos corpos”. Esse maravilhoso evento, a ressurreição, é assim revelado como o ponto final do gemido da criação.
Portanto, o significado dessa passagem com relação ao assim chamado “assunto milenar” está claro. O apóstolo Paulo, por inspiração do Espírito Santo, ensina que a glória da ressurreição dos filhos de Deus marcará também a glória da ressurreição da criação. Na vinda de Cristo, e não um milênio mais tarde, “a própria natureza criada será libertada da escravidão da decadência”, e participará da glória que é comparada à “gloriosa liberdade dos filhos de Deus”.
continua...
[18] John Murray, The epistle to the Romans (Grand Rapids: Eerdmans, 1959), vol. 1, p. 300.
Nenhum comentário:
Postar um comentário